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Portaria do governo Temer facilita o trabalho escravo

O governo de Michel Temer publicou nesta segunda-feira (16) portaria que dificulta a caracterização de trabalho escravo por quem fiscaliza a prática e a divulgação da lista de empresas que submetem seus funcionários a situações degradantes.

A medida também facilita o acordo de companhias flagradas pela fiscalização e impede que elas constem na chamada “lista suja” do trabalho escravo. Para assinar o TAC (Termo de Ajustamento de Conduta), a empresa não precisará mais realizar uma série de medidas para educar e reinserir no mercado o trabalhador submetido ao ofício análogo à escravidão. Com as novas regras, a Procuradoria-Geral do Trabalho (PGT) também fica fora da assinatura do acordo.

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A portaria, assinada pelo ministro Ronaldo Nogueira, atende a anseio da bancada ruralista no Congresso e seria uma troca por votos contrários à segunda denúncia criminal pesa sobre o presidente Michel Temer e tramita na Câmara.

A portaria foi publicada seis dias depois de o governo federal exonerar do Ministério do Trabalho o coordenador de combate ao trabalho escravo, em decisão criticada por entidades que combatem a prática. Segundo o Observatório Digital do Trabalho Escravo, ferramenta construída pelo MPT e pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) no Brasil, até agora 18 operações foram realizadas em 2017. No ano anterior, no mesmo período, foram 106, e em 2015, 155. Desde 2005, nenhum ano registrou a realização de menos de 100 ações do tipo.

Entenda em 14 pontos o que diz a nova portaria (nº 1129) e o que ela muda na caracterização do trabalho escravo:

1 ) Inclusão de “privação da liberdade” para caracterizar “jornada exaustiva” ou “condição degradante”

O artigo 149 do Código Penal define como trabalho escravo submeter a pessoa a trabalhos forçados ou jornada exaustiva, “quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador”. A lei prevê reclusão de dois a oito anos mais multa, podendo a pena ser aumentada se o crime é cometido contra crianças ou por motivo de raça ou outras discriminações.

A nova portaria, no entanto, limita as duas opções que existem para caracterizar o trabalho escravo (“quer condições degradantes, quer restringindo a locomoção”).

Ao conceituar “jornada exaustiva”, a portaria diz que ela só acontece quando submete o trabalhador “contra a sua vontade e com privação do direito de ir e vir”.

Ao conceituar “condição degradante”, a portaria vai no mesmo sentido e diz que ela se consubstancia “no cerceamento da liberdade de ir e vir, seja por meios morais ou físicos”.

Ou seja, o que consta como opções não excludentes no código penal (condição degradante ou restrição de locomoção) para caracterizar trabalho escravo se restringe a uma opção (privação de liberdade) na resolução que visa a orientar o trabalho de fiscalizadores do Ministério do Trabalho.

Assim, se uma pessoa é submetida a condições degradantes ou jornadas exaustivas, mas pode se locomover, não seria flagrado o trabalho escravo.

2) Menos benefícios aos trabalhadores vitimados

As novas regras são condições para a “concessão de beneficio de seguro-desemprego ao trabalhador que vier a ser identificado como submetido a regime de trabalho forçado ou reduzido a condição análoga à de escravo”.

Assim, aquele submetido a trabalho degradante ou jornada exaustiva não poderá receber seguro-desemprego se não se encaixar nos termos mais restritos da resolução.

3) Menos empresas na “lista suja” do trabalho escravo

As novas regras também tem a finalidade de definir a “inclusão do nome de empregadores no Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores à condição análoga à de escravo”.

Deste modo a empresa poderia submeter empregados a trabalhos degradantes e jornadas exaustivas, desde que não tirem seu direito de ir e vir, sem ter o nome na lista suja por isso.

4) Restrição à fiscalização do Ministério do Trabalho

Diz o artigo 2º da portaria de Temer: “Os conceitos estabelecidos no artigo 1º (acima descritos) deverão ser observados em quaisquer fiscalizações procedidas pelo Ministério do Trabalho, inclusive para fins de inclusão de nome de empregadores no Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores à condição análoga à de escravo”.

Ou seja, os funcionários do Ministério do Trabalho deverão observar conceitos mais restritos que a própria lei para definir o trabalho escravo nas ações de fiscalização.

5) Mais restrições à aplicação da lei

O fiscal do ministério do Trabalho deverá, pelas regras da portaria, fazer uma “descrição detalhada” e “obrigatória” de diversos itens, que restringem ainda mais a caracterização do trabalho escravo. São eles:

a) existência de segurança armada diversa da proteção ao imóvel;
b) impedimento de deslocamento do trabalhador;
c) servidão por dívida;
d) existência de trabalho forçado e involuntário pelo trabalhador.

6) Ministro determina inclusão da empresa na “lista suja”

O que antes era uma divulgação técnica agora se torna uma decisão política. “O Ministro de Estado do Trabalho determinará a inscrição do empregador condenado no Cadastro de Empregadores que submetem trabalhadores a condição análoga às de escravo”, diz o inciso 3º do inciso IV, artigo 3º da resolução.

A empresa só constará na “lista suja” do trabalho escravo após a canetada do indicado do presidente da República ao ministério do Trabalho.

7) Divulgação da lista também dependerá de autorização do ministro

A divulgação, prevista em lei, da lista de empregadores que escravizam trabalhadores dependerá de “autorização expressa” do ministro do Trabalho, segundo o parágrafo 1º do artigo IV.

A inclusão na lista se dá também após a empresa não ter mais opções de recursos sobre o processo administrativo.

8) Mais poder para a SIT barrar investigações

Diz o artigo 5º da resolução: “a SIT (Secretaria de Inspeção do Trabalho) poderá, de ofício ou a pedido do empregador, baixar o processo em diligência, sempre que constatada contradição, omissão ou obscuridade na instrução do processo administrativo, ou qualquer espécie de restrição ao direito de ampla defesa ou contraditório”.

Ela também poderá devolver o processo para o auditor-fiscal se não constarem uma série de documentos, inclusive “o registro fotográfico da ação e identificação dos envolvidos no local”, obrigatórios.

9) Atualização demorada da lista suja

Além dos poderes para o ministro postergar a inclusão de empresas na “lista suja”, ela só será atualizada duas vezes ao ano, em junho e novembro, em vez de ser uma atualização automática, segundo o artigo 5º da resolução.

A portaria anterior (com trechos revogados), de maio de 2016, dizia que a atualização da relação poderia acontecer “a qualquer tempo” e em prazo inferior a seis meses. O antigo prazo máximo foi estabelecido como regra.

10) Escrutínio e diminuição da lista suja

A portaria estabelece ainda que “as decisões administrativas irrecorríveis de procedência do auto de infração, ou conjunto de autos de infração, anteriores à data de publicação desta Portaria valerão para o Cadastro após análise de adequação da hipótese aos conceitos ora estabelecidos”.

Ou seja, empresas já condenadas por trabalho escravo e presentes na lista suja só continuarão expostas “após análise de adequação” às novas regras, mais permissivas, estabelecidas pela resolução.

11) Acordo facilitado para fugir da lista suja – e de punições judiciais

Entre o momento do flagrante e o fim do processo administrativo, a empresa poderá propor um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) ou acordo judicial, segundo o artigo 6º da resolução.

Vítimas perdem diversos benefícios, segundo pontos revogados da portaria anterior (Ascom)

Na resolução anterior (MTPS/MMIRDH Nº 4 DE 11/05/2016), em trecho revogado pela nova, a empresa que assinasse o acordo continuaria aparecendo em uma “segunda relação”, ou lista, localizada logo abaixo da primeira “lista suja” e na mesma divulgação. Agora, essa obrigação caiu.

A empresa poderá ainda em tese tentar impugnar, invalidar ou afastar eficácia dos efeitos legais dos autos de infração em que o trabalho escravo foi encontrado, caso assine o TAC. A proibição dessa tentativa foi derrubada pela nova portaria.

12) Procuradoria fora do acordo

Na resolução anterior, em trecho revogado, tentativa do acordo judicial entre a empresa flagrada deveria ser comunicada à Procuradoria-Geral do Trabalho (PGT), que tinha a oportunidade de acompanhar e participar de sua celebração.

Essa disposição foi retirada da nova portaria.

13) Menos obrigações para o acordo – e menos benefícios de reparação

Foram retiradas das condições para a assinatura do acordo questões como valor mínimo de indenização a empregados, a) “ressarcimento ao Estado de todos os custos envolvidos na execução da ação fiscal e no resgate dos trabalhadores”, b) “contratação de trabalhadores egressos de programa de qualificação” em número três vezes superior ao de vítimas encontradas, c) relatórios periódicos de auditoria de controle, d) necessária comprovação de medidas corretivas em 30 dias d) inclusão dos trabalhadores que foram vítimas em programa educacional e de reinserção no mercado de trabalho de no mínimo um ano, com custos bancados pela empresa, entre outras.

Tudo isso deixa de ser necessário.

14) Reincidência facilitada

Foi revogado também o art. 11 da portaria anterior, que previa que a empresa que celebrou o acordo ficava sujeita à fiscalização da Inspeção do Trabalho e impedida de celebrar novo TAC em caso de reincidir no crime. Agora, a companhia poderia celebrar novo acordo para escapar novamente da lista suja.

Fonte: 

 http://jovempan.uol.com.br/noticias/

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