Lei Maria da Penha, lançada em 2006, foi bem-sucedida ao estimular denúncias, mas ainda esbarra na morosidade da Justiça para garantir segurança a mulheres
É inegável que o combate à violência contra a mulher tenha mudado desde a criação da Lei Maria da Penha, em 2006, grande propulsora de denúncias, cada vez mais frequentes. As vítimas, no entanto, nem sempre encontram respaldos na Justiça. De acordo com dados do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJ-PE), entre os quase 110 mil processos enquadrados no dispositivo legal, entre 2006 e julho de 2016, apenas 6,9 mil resultaram em condenações dos acusados, normalmente companheiros das agredidas – um percentual pouco superior a 6%.
A velocidade dos processos torna-se ainda mais relevante quando atestamos que esse tipo de violência é uma realidade que atinge amplamente o estado: considerando que Pernambuco conta com 2,5 milhões de domicílios, segundo o IBGE, é como se, na última década, um em cada 23 residências tivessem moradores como parte de processos tramitando na Justiça. Isso desconsiderando que o número de vítimas registrado ano a ano pela Secretaria de Defesa Social é quase o dobro do número de processos que passam pelo Ministério Público e, de fato, chegam ao sistema judiciário.
Para a Desembargadora do TJ-PE Daisy Pereira, responsável pela Coordenadoria Estadual da Mulher, a diferença entre os processos em tramitação e a pequena parcela resultante em condenação se dá pelo grande volume de processos contra uma quantidade insuficiente de pessoal para dar conta de todos eles de forma célere. “A dificuldade passa pelo número de defensores, de juízes, de advogados, para lidar com um volume muito grande de processos. A Justiça sofre com relação a isso de modo geral – nos processos criminais mais ainda”, aponta.
Mesmo reconhecendo que há necessidade de melhorias, a desembargadora reitera que a Maria da Penha virou uma grande ferramenta de emponderamento das mulheres.
Visão compartilhada pela moradora do Paulista, Elisabete (fictício), 50, que sentiu na pele tanto a dor causada pela violência, quanto o alívio trazido pela lei, após mais de 20 anos de um casamento marcado por uma rotina de agressão iniciada oito meses após a união. “Até que um dia, de duas horas da madrugada, eu chamei a polícia e fui na Delegacia da Mulher. Finquei meu pé e entendi que, dali, não podia dar um passo para trás”, relembra.
Ficou três meses em um abrigo do governo do estado, recebendo acompanhamento psicológico. “Até hoje, sou dependente de remédios controlados, já tive quatro depressões. Mas a Lei me fortaleceu. Hoje percebo que o maior erro foi não ter denunciado antes, por vergonha, por acreditar que seria diferente”, destaca.
Contornar esse sentimento de vergonha é um dos desafios a serem contornados para assegurar a segurança das mulheres e, por isso, a desembargadora Daisy lembra que, por se tratar de um crime de ação pública incondicionada, a agressão contra a mulher enquadrada na Lei Maria da Penha não permite desistência no processo. “A mulher só pode desistir da denúncia em caso de ameaça. Quando há a agressão, a denúncia prossegue”, explica.
Ela destaca ainda que há sete varas especializadas em casso do gênero espalhadas pelo estado, para descentralizar os processos e tentar agilizar o trâmite legal. “Além disso, também realizamos a Semana da Justiça Pela Paz em Casa, uma força-tarefa justamente para acelerar o andamento do processo (em 2016, ocorrerá entre os dias 15 e 19 de agosto)”.
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